Entrevista: Inocêncio fala sobre a política nacional, estadual e de Serra Talhada


Por Magno Martins

Da mesma forma que acontece no futebol, reinado curto para os que fazem com seus dribles, passes certeiros e gols a alegria do torcedor, na política também existe o tempo de pendurar as chuteiras. Como o sábio Roberto Magalhães, que se rendeu à realidade da vida efêmera do parlamento, dobrando-se à vontade do povo, Inocêncio Oliveira, o Trovão do Sertão, também saiu de cena em 2014 depois de brilhar por 40 anos no Congresso.

Deputado federal por dez legislaturas seguidas, único escolhido como um dos mais eficientes por 18 vezes em todas as listas do DIAP, o Ibope do Congresso, sempre com votações invejáveis – a derradeira obteve quase 200 mil votos, exatos 198.407 votos – Inocêncio fez suas despedidas da Câmara dos Deputados, instituição que ocupou todos os cargos de Mesa, sendo presidente na legislatura 1993-94, com um discurso antológico numa tarde chuvosa de Brasília, em 19 de novembro de 2015, aos 76 anos.

De lá para cá, diferente de outros que não sabem viver longe dos holofotes, Inocêncio se dobrou ao império da lei da insignificância de ex. Recolheu-se, forçado por seqüelas de uma cirurgia mal sucedida no joelho, aumentou o fosso da distância da mídia pelas dificuldades de audição, mas exibe boa saúde aos 81 anos.

Largou o parlamento, nas não abandonou a atividade política.
Sempre às terças-feiras, bate o ponto no seu escritório, localizado no bairro da Imbiribeira, zona sul do Recife.

Ali, em meio a um ambiente em que expõe aos olhos do visitante a sua vaidade – medalhas, troféus e outros símbolos de milhares honrarias recebidas ao longo do tempo de mandato, dos quais 137 títulos de cidadão – o velho cacique de Serra Talhada, a terra do ilustre conterrâneo Agamenon Magalhães e de Lampião, aceitou ser provocado por este colunista, blogueiro e âncora de rádio, rompendo o silêncio.

Ele me recebeu, ontem, pela manhã. Falou de tudo, desde o seu ingresso na política em 1974, estimulado pelos serviços prestados como médico cirurgião, até os dias atuais. Sua visão de País: a economia pode dar certo, mas o presidente é maluco e tem filhos atrapalhadores da sua gestão.

Pernambuco: há uma saturação de PSB, o governador Paulo Câmara é um cavalheiro, mas não tem pulso, não sabe dar murro na mesa. Recife: Geraldo terá enormes dificuldades em eleger João Campos, herdeiro político de Eduardo Campos, a quem classifica de “o Pelé da política”. Confira abaixo:

Como está Inocêncio Oliveira?

Estou muito bem, recuperei bastante minha articulação do joelho, com sessões de fisioterapia três vezes por semana. Continuo com dificuldades de audição, chaga que herdei para cima e para baixo em aviões. Faço dieta, exames regulares e curto bastante meus netos, a família. Permaneço um devorador de livros e de notícias. Seu blog, por exemplo, eu acesso aqui (tira o celular do bolso e o exibe).

Sente saudade do Congresso Nacional?

Nenhuma! Aliás, o Congresso baixou demais o seu nível, perdeu autonomia e lideranças expressivas. É triste assistir, hoje, o Judiciário interferindo no parlamento e legislando. No meu tempo, as interferências do Supremo eram raras, porque existiam lideranças que impunham respeito, um Ulysses Guimarães, por exemplo, que tanta falta faz. Ele dizia que quanto mais o tempo avançava, mais o parlamento brasileiro tendia a perder o tempero da eloqüência. Dizia: “Estais achando ruim esta legislatura? Espere a próxima”.

O senhor sente vergonha, então, do atual Congresso?

Não se trata de vergonha, mas de desapontamento. Bate uma tristeza enorme olhar para um Senado presidido por Davi Alcolumbre, com quem convivi na Câmara, ele deputado pelo Amapá. Nada contra a pessoa dele, mas não tem um predicativo elementar para tocar com firmeza o Senado: liderança. É mais um desses personagens da política que surgem do nada e não adquirem o respeito da sociedade brasileira. Já Rodrigo Maia, presidente da Câmara, filho de um grande amigo, o ex-prefeito do Rio, César Maia, impôs autoridade e, não fosse ele, a reforma da Previdência não teria saído. Foi um gigante, bateu de frente com o Governo, como eu na época em que presidi a Casa, e se houvesse o sistema parlamentarista no País com certeza ele seria o primeiro-ministro.

Qual sua avaliação do Governo Bolsonaro?

Convivi com Bolsonaro ele deputado pelo Rio e eu, já em cargos na mesa diretora da Câmara, de forma respeitosa e amiga. Ninguém lhe dava crédito, ninguém, presidindo as sessões em plenário, abria o microfone para ele, com raras exceções, como eu, para suas verborragias. Não tinha credibilidade, nem espaço na mídia. Sua eleição repentina foi obra da frustração brasileira com o PT, partido que se arvorou do poder para promover falcatruas e escrever o capítulo mais triste e escandaloso de corrupção na história recente do País. Acho seu Governo razoável, com mais acertos do que erros na política econômica. O seu grande problema não é virar a página da recessão e da falta de investimentos, mas sim os filhos.

Como assim?

Os filhos atrapalham muito, ele se curva às viagens delirantes dos filhos, que parecem loucos. Por falar em loucura, acho que Bolsonaro tem um parafuso solto na cabeça, com decisões e declarações que nos remetem a concluir que é doido, não tem um pingo de juízo. Sou daqueles que torcem para enxergar uma luz ao final do túnel, mas quando a gente imagina que algo pode dar certo neste Governo os filhos do presidente botam a sua colher e empanzinam o tempero. Filhos não são feitos para gerar problemas, mas soluções, principalmente em se tratando da coisa pública. Se Bolsonaro tivesse pulso com os seus filhos, e não fosse se submeter a caprichos, nunca teria admitido em nomear um deles embaixador brasileiro nos Estados Unidos. Uma pouca vergonha na cara!

Entrando nas questões do Estado, o governador Paulo Câmara faz uma gestão palatável ao seu estômago?

Olha, Magno, eu acho que o governador é um cidadão bastante educado e gentil, diria se tratar de um verdadeiro gentleman, mas sua administração, mesmo que tenha alguns acertos aqui e acolá, se exauriu, porque não impôs a sua marca. Oliveira Lima dizia que ninguém governa governador, mas este não parece ser um conceito adaptado nos dias atuais a Pernambuco. Pernambuco empobreceu muito no campo administrativo e político. Nós perdemos de forma precoce, inesperada e chocante o Pelé da política, o nosso Eduardo Campos, Brasil perdeu o seu Pelé. Podem jogar pedras em Eduardo por um motivo ou outro, por desacertos que são normais na vida pública, mas ninguém pode deixar de reconhecer que ele era um craque na armação do jogo político. Com a sua morte se abriu um vácuo político nunca visto na história de Pernambuco. Junto ao seu corpo no túmulo enterraram a liderança de Pernambuco na vida nacional.

Geraldo Júlio elege o sucessor no Recife?

Tenho minhas dúvidas, o cenário que se apresenta é de uma cortina de fogo ardente para o PSB, porque o pernambucano está saturado de PSB, quase 16 anos no poder estadual, oito na Prefeitura do Recife, isso ninguém aguenta. O rodízio na gestão pública é elementar.

O senhor não teme pelo duro julgamento, já que faz parte da conjuntura política do poder e tem parentes próximos, como o deputado Sebastião Oliveira, com aliados ocupando cargos?

Quando pendurei as chuteiras deixei de fazer indicações políticas. Não tenho um só cargo neste Governo nem na Prefeitura. Até me pediram indicações, mas eu não quis. Deixa-me ficar aqui no meu canto quieto, estou em outro plano da vida. Eu só estou dando esses pitacos porque você, como repórter inquieto e que adora polêmicas, gosta de atiçar, me procurou. Se Sebastião tem cargos, hoje, é por indicação da autoridade que lhe compete como parlamentar da base governista. Eu não temo poderosos, Magno. Para quem saiu como eu, lá do Sertão, negro, gago e discriminado, não temo nada. Tenho que me curvar a Deus todos os dias, como faço (aponta para uma santa em seu gabinete), temente aos castigos divinos por ter tido uma trajetória de vida gloriosa e honrosa, com ápice marcado pela minha presença interina na Presidência da República por mais de 60 dias.

O senhor diz que há saturação de PSB, mas a oposição construiu alternativas?
É ai onde está o nó da questão: o PSB não empolga mais, há um sentimento muito forte por mudanças, mas a oposição não tem um nome capaz de representar esse caminho da reviravolta. No Recife, falam muito em Marília Arraes, do PT, mas não acho que encarne o desejo da sociedade. Diferentemente da deputada Tábata Amaral (PDT-SP), preparada, com especialização na área de Educação em Harvard, Marília não tem estampa. Faz o velho feijão com arroz. Deve ter pontuações nas pesquisas por causa do sobrenome Arraes, pelo fato de ser mulher e exibir olhos azuis ou verdes, não lembro.

Mas o que falam de João Campos é que ele é muito jovem, imaturo para governar uma cidade como o Recife...

Verdade e concordo plenamente. Ter pelo na venta e cabelos embranquecidos são requisitos fundamentais para o exercício da atividade pública. O chanceler Konrad Adenauer levou sua Alemanha aos píncaros da glória já num estágio bem avançado da vida. Nada que não se possa aprender, mas para políticos novos como João, se vier a ser eleito, tem que encher a sua equipe de quadros técnicos e políticos os mais qualificados. Se a gente, que já está num estágio da vida bem diferenciado dele, comete lapsos e atropelos no dia a dia, imagine ele, que está vendo o sol nascer agora!

Mas Geraldo aposta na vitrine da sua gestão para eleger João...
Geraldo sonha em ser governador em 2022, repetindo a saga de Eduardo, que o elegeu prefeito. Por sorte dele, Pernambuco é, hoje, um Estado sem uma liderança expressiva na oposição e o cenário que se apresenta para a sucessão de Paulo Câmara é muito favorável para ele (Geraldo). A eleição de João, que ele deseja a todo custo, não vai ser fácil, até porque em termos de vitrine sua gestão tem que melhorar muito. Sou médico e reconheço que o Hospital da Mulher foi a grande obra de Geraldo, mas ele tem que destravar o trânsito, tapar os buracos da cidade. Não sabe ele, mas as pessoas andam muito a pé, a cidade é desprovida de boas calçadas. Outra coisa que me entristece no Recife é o desemprego, muita gente dormindo nas ruas, o centro comercial falido e abandonado.

Por fim, o senhor vai se envolver na política de Serra Talhada, sua terra natal?

Já estou envolvido de corpo e alma para derrotar o prefeito Luciano Duque. Lá, temos duas opções: o ex-prefeito Carlos Evandro e Victor Oliveira, meu neto. Reconheço que Carlos Evandro é um bom gestor, mudou o perfil de Serra, mas eu torço e trabalho pela união do grupo em torno da candidatura do meu neto, vocacionado para a vida pública.

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